Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
Festa do Batismo do Senhor - Ano C
Lc 3,15-16.21-22
"Este é o meu Filho amado,
que muito me agrada"
Oração do dia
Deus eterno e todo-poderoso, que, sendo Cristo batizado no
Jordão e pairando sobre ele o Espírito Santo, o declarastes solenemente vosso
Filho, concedei aos vossos filhos adotivos, renascidos da água e do Espírito
Santo, perseverar constantemente em vosso amor. Por Nosso Senhor Jesus Cristo,
Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo.
Evangelho (Lucas 3,15-16.21-22)
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas.
Naquele tempo, 3,15 como o povo estivesse na
expectativa, e como todos perguntassem em seus corações se talvez João fosse o
Cristo,
16 ele tomou a palavra,
dizendo a todos: “Eu vos batizo na água, mas eis que vem outro mais poderoso do
que eu, a quem não sou digno de lhe desatar a correia das sandálias; ele vos
batizará no Espírito Santo e no fogo”.
21 Quando todo o povo ia
sendo batizado, também Jesus o foi. E estando ele a orar, o céu se abriu
22 e o Espírito Santo
desceu sobre ele em forma corpórea, como uma pomba; e veio do céu uma voz: “Tu
és o meu Filho bem-amado; em ti ponho minha afeição”.
Palavra da Salvação.
Comentário ao Evangelho
Hoje, no Domingo seguinte à Epifania, celebra-se a Festa do Batismo do
Senhor. O batismo de Jesus por João Batista no Rio Jordão é tão importante
teologicamente que é tratado por cada um dos Sinóticos, cada qual da sua
maneira, dependendo da situação da sua comunidade e dos seus interesses
teológicos. A história logo se tornou um problema para os primeiros cristãos,
pois levantava a questão de como Jesus, sem pecado, podia ter sido batizado num
ritual de purificação dos pecados. Por isso, Mateus deixa fora a referência de
Mc 1,4 ao perdão dos pecados, e adiciona os vv. 14 e 15. Para João, o batismo
era tão difícil de ser harmonizado com a sua cristologia, que omite qualquer
referência ao atual evento, e no seu lugar, faz com que João Batista indica
Jesus como o “Cordeiro de Deus” (Jo 1,29-34).
O texto já nos apresenta o programa da vida e missão de Jesus. Lucas se
destaca pela insistência em situar Jesus como membro do seu povo -
identificando-se com aquela camada do povo marginalizada e menosprezada como
“impuro” pela teologia oficial, atrelada ao poder político das elites. Como
disse o saudoso Padre Alfredinho, fundador da Fraternidade do Servo Sofredor:
“No dia do seu batismo, Jesus entrou na fileira dos excluídos para nunca mais
sair dela!” Com o seu batismo, Jesus assume a fidelidade radical à vontade de
Deus. O significado disso será mostrado ao longo do Evangelho. Também Jesus,
unindo-se aos pecadores, já está, desde o começo, rejeitando a visão de um
Messianismo triunfalista.
Os sinóticos ressaltam o fato que “o céu se abriu”. Marcos é o mais
contundente quando enfatiza que “os céus se rasgaram”. É uma maneira simbólica
de expressar que em Jesus acontece a união definitiva entre o céu e a terra (At
7,56; 10,11-16; Jo 1,51) e uma revelação celeste (Is 63,19; Ez 1,1; Ap 4,1; 19,11). A revelação maior é a confirmação da identidade de Jesus como o
Servo de Javé. Mateus, escrevendo num ambiente de polêmica contra o judaísmo
formativo do fim do primeiro século, muda a tradição original (Mc 1,9-11),
mantida por Lucas, onde as palavras do Pai se dirigiam a Jesus, para dirigi-las
aos ouvintes: “Este é o meu Filho muito amado, aquele que me aprouve escolher”
(v. 17). Em ambas as tradições, essas palavras associam a terminologia de Sl 2,7, que repete a profecia de Natã em 2Sm 7,14 (tu és meu filho...) a Is 42,1
(meu bem amado que me aprouve escolher). A passagem de Isaías apresenta o Servo
que não levanta a voz (42,2), nem vacila, nem é quebrantado (42,4). (A
tradução grega da Septuaginta usou uma palavra que podia expressar tanto os
termos hebraicos para “filho” e para “servo”). Fazendo fusão desses textos do
Antigo Testamento, o texto une em Jesus duas figuras proféticas - a do Filho da
descendência real davídica e do Servo de Javé. Assim, prevê que o messianismo
de Jesus implica a vocação do Servo Sofredor, e rejeita pretensões messiânicas
triunfalistas. Podemos dizer que o Batismo é para Jesus o assumir público da
sua missão como Servo de Javé. A voz do céu confirma a sua opção de vida. O Pai
confirma que Ele reconhece Jesus, desde o início do seu ministério público,
como seu Filho (Sl 2,7), seu bem-amado, objeto da sua predileção.
Um dos sentidos mais importantes do nosso batismo também é o nosso
compromisso público com a vontade do Pai. Todos nós podemos sentir a veracidade
da mesma frase usada pelo Pai diante de Jesus - cada um de nós também é
verdadeiramente filho(a) do Pai celeste (1Jo 3,1), a quem aprouve
escolher-nos. Nada pode fazer com que o Pai abandone esse amor incondicional e
gratuito - nem a nossa fraqueza, nem o pecado (Rm 8,39). Importante é
reconhecer que Deus nos amou primeiro, incondicionalmente, e cabe a nós
responder a este amor gratuito por uma vida digna de filhos e filhas do Pai, no
seguimento de Jesus (1Jo 4,10-11). Jesus não achou privilégio ser o amado do
Pai, mas assumiu as consequências - uma vida de fidelidade, que o levava até a
Cruz - e a Ressurreição (Fl 2,6-11).
Celebrando essa festa
litúrgica, renovemos o compromisso do nosso batismo, comprometendo-nos com o
seguimento do Mestre, no esforço de contribuir à criação do mundo que Deus
quer, um mundo onde reinam o amor, a justiça e a verdadeira paz. O nosso batismo
confirma que somos parceiros de Deus no ato permanente de criação, fazendo
crescer o Reino d’Ele, que “já está no meio de nós” (Mc 1, 14).
Salmo 28/29
Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo!
Filhos de Deus, tributai ao Senhor,
tributai-lhe a glória e o poder!
Dai-lhe a glória devida ao seu nome;
adorai-o com santo ornamento!
Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo!
Eis a voz do Senhor sobre as águas,
sua voz sobre as águas intensas!
Eis a voz do Senhor com poder!
Eis a voz do Senhor majestosa.
Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo!
Sua voz no trovão reboando!
No seu templo os fiéis bradam: “Glória!”
É o Senhor que domina os dilúvios,
o Senhor
reinará para sempre!
Que o Senhor abençoe, com a paz, o seu povo!
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