Refletindo o Evangelho do Domingo
Pe. Thomaz Hughes, SVD
DÉCIMO NONO DOMINGO COMUM - Ano C
Lucas 12,32-48
“Onde está o seu tesouro, aí
estará também o seu coração”
Oração do dia
Deus eterno e todo-poderoso, a quem ousamos chamar de Pai,
dai-nos cada vez mais um coração de filhos, para alcançarmos um dia a herança
que prometestes. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do
Espírito Santo.
Evangelho (Lucas 12,32-48)
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas.
12,32 Disse Jesus: “Não temais, pequeno rebanho, porque foi do
agrado de vosso Pai dar-vos o Reino.
33 Vendei o que possuís e dai esmolas; fazei para vós bolsas
que não se gastam, um tesouro inesgotável nos céus, aonde não chega o ladrão e
a traça não o destrói.
34 Pois onde estiver o vosso tesouro, ali estará também o
vosso coração.
35 Estejam cingidos os vossos rins e acesas as vossas
lâmpadas.
36 Sede semelhantes a homens que esperam o seu senhor, ao
voltar de uma festa, para que, quando vier e bater à porta, logo lha abram.
37 Bem-aventurados os servos a quem o senhor achar vigiando,
quando vier! Em verdade vos digo: cingir-se-á, fá-los-á sentar à mesa e
servi-los-á.
38 Se vier na segunda ou se vier na terceira vigília e os
achar vigilantes, felizes daqueles servos!
39 Sabei, porém, isto: se o senhor soubesse a que hora viria
o ladrão, vigiaria sem dúvida e não deixaria forçar a sua casa.
40 Estai, pois, preparados, porque, à hora em que não
pensais, virá o Filho do Homem”.
41 Disse-lhe Pedro: “Senhor, propões esta parábola só a nós
ou também a todos?”
42 O Senhor replicou: “Qual é o administrador sábio e fiel
que o senhor estabelecerá sobre os seus operários para lhes dar a seu tempo a
sua medida de trigo?
43 Feliz daquele servo que o senhor achar procedendo assim,
quando vier!
44 Em verdade vos digo: confiar-lhe-á todos os seus bens.
45 Mas, se o tal administrador imaginar consigo: ‘Meu senhor
tardará a vir’, e começar a espancar os servos e as servas, a comer, a beber e
a embriagar-se,
46 o senhor daquele servo virá no dia em que não o esperar e
na hora em que ele não pensar, e o despedirá e o mandará ao destino dos
infiéis.
47 O servo que, apesar de conhecer a vontade de seu senhor,
nada preparou e lhe desobedeceu será açoitado com numerosos golpes.
48 Mas aquele que, ignorando a vontade de seu senhor, fizer
coisas repreensíveis será açoitado com poucos golpes. Porque, a quem muito se
deu, muito se exigirá. Quanto mais se confiar a alguém, dele mais se há de exigir”.
Palavra da Salvação.
Comentário
Esse trecho
do capítulo doze retoma em grande parte o tema do domingo anterior - a questão
do relacionamento do cristão e da comunidade com os bens materiais. A
comunidade cristã é caracterizada como “pequeno rebanho” - certamente pequena
diante da força e enormidade do sistema do Império Romano. Aqui não é tão
importante a sua pequenez em termos numéricos, mas em termos da sua importância
e força dentro da sociedade - a fraqueza dela é gritante, e devia ter provocado
insegurança e medo em muitos dos seus membros. Por isso, as palavras de
encorajamento: “Não tenha medo, pequeno rebanho, porque o Pai de vocês tem
prazer em dar-lhes o Reino” (v. 32).
O rebanho não
tem muitos bens materiais, mas terá os bens mais importantes - os do Reino.
Esta idéia nasce do versículo anterior a este trecho: “Busquem o Reino d’Ele e
Deus dará a vocês essas coisas em acréscimo” (v. 31). Estes bens virão na
medida em que a comunidade vive a partilha, ou seja, se coloca na contramão de
uma sociedade de ganância e exploração, repartindo o que tem. Retomando o tema
do último domingo, Jesus adverte: “De fato, onde está o seu tesouro, aí estará
também o seu coração” (v. 34).
Esse último
versículo nos desafia a fazermos uma meditação mais profunda sobre os valores
da nossa vida. Onde - realmente, e não teoricamente - está o meu tesouro? Em
que eu de fato ponho a minha confiança? Sobre o que estou baseando a minha
vida? Qual é a minha experiência prática de partilha? Quais são os verdadeiros
tesouros da minha vida?
Em seguida,
Lucas nos coloca diante das exigências de vigilância e responsabilidade. Embora
muitas vezes se interprete este trecho sobre a vinda do Senhor em termos do “fim
do mundo”, ou referindo-se ao momento da nossa morte, realmente esses versículos
têm uma abrangência muito maior. A ênfase não está no fim, mas na atitude que nós
devemos ter sempre em nossa caminhada. Sempre devemos estar alertas, para não
perdermos o momento de Jesus passar em nossa vida. Ele chega para nós, não
somente na hora da nossa morte, muito menos no fim do mundo, mas todos os dias,
nas pessoas, nos acontecimentos da nossa realidade, na comunidade em que
vivemos. Jesus aqui exige uma atitude de busca permanente do Reino, através de
uma vida de serviço fraterno. Como diz o teólogo José Pagola no seu livro sobre
Lucas, “é surpreendente a insistência com que Jesus falas da vigilância.
Pode-se dizer que Ele entende a fé como uma atitude vigilante que nos liberta
do absurdo que domina muitos homens e mulheres, que andam pela vida sem meta
nem objetivo nenhum” (Pagola “O caminho aberto por Jesus” Vozes p.213.) Os versículos 41-46, e o fato que a pergunta é
feita por Pedro, porta-voz dos líderes da comunidade em Lucas, indicam que a
mensagem aqui é dirigida em primeiro lugar aos que têm a função de dirigente na
comunidade. Os dirigentes cristãos não têm estes ofícios para exercer um poder,
para dominar, mas muito pelo contrário, para melhor servir. Somos alertados
para que não deixemos a corrupção do poder tomar conta da nossa vida. Como os
dirigentes das comunidades têm consciência dos seus deveres, muito mais ainda é
a sua responsabilidade: “A quem muito foi dado, muito será pedido; a quem muito
foi confiado, muito mais será exigido” (v. 48).
Aqui o
trecho alarga a sua visão para incluir não somente uma possível corrupção do
projeto cristão através do apego aos bens materiais, mas também através do
apego ao poder, quando este é usado não como serviço, mas como dominação e
projeção pessoal por parte dos dirigentes cristãos. Talvez, não haja corrupção
mais sutil do que a do poder, manifestada em carreirismo, autoritarismo e
auto-projeção dentro das Igrejas. Vale a advertência já feita no século XIX
pelo historiador católico inglês, Lord Acton: “Todo o poder tende a corromper,
e o poder absoluto corrompe absolutamente!”
Lucas convida a todos,
especialmente os dirigentes, à vigilância, para que o nosso verdadeiro tesouro
seja o serviço fraterno, como concretização do projeto de Jesus, e não a ganância,
o poder, a dominação.
Salmo 32/33
Feliz o povo que o Senhor escolheu por sua herança!
Ó justos, alegrai-vos no Senhor!
Aos retos fica bem glorificá-lo.
Feliz o povo cujo Deus é o Senhor
e a nação que escolheu por sua herança!
Feliz o povo que o Senhor escolheu por sua herança!
Mas o Senhor pousa o olhar sobre os que o temem
e que confiam, esperando em seu amor,
para da morte libertar as suas vidas
e alimentá-los quando é tempo de penúria.
Feliz o povo que o Senhor escolheu por sua herança!
No Senhor nós esperamos confiantes,
porque ele é nosso auxílio e proteção!
Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça,
da mesma forma que em vós nós esperamos!
Feliz o povo que o Senhor escolheu por sua herança!
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